sexta-feira, 17 de abril de 2009

tempo, espaço, cutícula



Aqui onde eu moro da pra sentir a velocidade do mundo, porque aqui é fora do mundo. Dá pra ver a terra azul, um azul meio cinza pra ser mais exato. Daqui eu ouço o eco das vozes de pessoas queridas, esses aliens distantes. Aqui o tempo é medido pelo piscar dos meus olhos e o amor so se traduz em lágrimas que chegam sempre sem aviso. A saudade rasga-me a boca com alguns sorrisos tímidos. Este é o lugar onde cheguei mas definitivamente é um lugar de onde vou partir. A paz, a beleza e a calma dessa atmosfera suga-me todo o tormento que cultivei com tanto carinho. Abrir os olhos e enxergar tanta luz não e pra qualquer um. À medida em que crio raízes em terras tão distantes vejo de cima os frutos que caem ainda verdes e deformados. Aqui de cima e fácil ver tudo, a vida, a gloria, a miséria, os quatro cantos e outros mais. Difícil mesmo é enxergar onde é aqui. Aqui preciso mais de mim e menos de eu mesmo. De vez em quando cruzo com o tal por aí e nem falo nada, só de raiva. Outras vezes tento ficar mais próximo e tudo, mas não resulta, o sujeto é irredutivel. Por aí é aqui dentro mesmo. Tô de rolê procurando o formato das coisas. Forma, função, criação. É mesmo fácil se deixar seduzir por esse tipo de bobagem. Essa vida aqui, por exemplo, tem forma de nuvem às vezes: Forma de nuvem com formato de pistola laser quebrada passando bem rápido. Forma de nuvem com formato de ursinho-macaco-cachorrinho-brincando-de-bambolê-com-cara-de-caveira-e-de-fusca, descendo devagarzinho. Forma de nuvem com formato de nuvem mesmo, mas nuvem bonita. Forma de nuvem feia também. Difícil é achar um espelho pra nuvem. Cruzamos esses céus sem nos dar conta que o povo escoriado por nossas tempestades lá em baixo pode achar essas formas bem engraçadas, pra ser sincero. Quase toda nuvem tem forma de banana amassada, só que não dá pra generalizar. Ok, respira fundo agora porque tá sangrando! 1, 2, 3, morreu. La vai mais um sonho, todo moído, todo morto, mas a sujeira some com ele, não, não é que nem gente que morre e apodrece. Aqui é assim pelo menos. Gente dá pra fatiar sem matar também, só que dá um trabalho imenso colar os pedaços depois, faz sujera e pode estragar. Eu mesmo tô todo torto porque um pedaço obsoleto do cotovelo direito foi inadvertidamente colado com fita dupla-face entre as duas primeras vértebras contando da cabeça pra baixo. Tá mais difícil ainda olhar pros lados agora. Deve ter cura, vou ver no Google. Depois, tem esse silêncio todo aqui. Aqui eu quebro ele em pedacinhos bem pequenos usando o teclado e o mouse. Faz tec, tec, tec, click, click e pára de silêncio. Não é nada difícil isso. É que tem umas formas que eu achei mesmo, tive algumas idéias, mandei pro departamento de marketing, orcei e agora algumas pontes estão sendo construídas e o tempo das espetaculares demolições parece ter dado uma trégua. O tempo dá trégua às vezes, o espaço é que não pára nunca, tá sempre ali. Já volto.

2 comentários:

poli disse...

Esse texto merece um minuto de silencio da morte que é tempo e não espaço.

Mayra disse...

bom isso que tu tá fazendo: com o texto e com a vida.
saudade grande, zé.
beijo